Karen e Keyla, talentos
revelados em eventos culturais da região, destacam-se em peça baseada na obra
do dramaturgo Nelson Rodrigues
Douglas Abreu
Histórias
surpreendentes sobre infidelidade e peculiaridades de vidas quase normais. A
coluna “A Vida Como Ela É” de Nelson Rodrigues no jornal carioca “A Última
Hora”, foi publicada de 1951 a 1961. A princípio, o espaço deveria chamar-se
“Atire a Primeira Pedra” e contar com uma ficção diária inspirada em uma
notícia do caderno policial. Após um certo tempo, Nelson sugeriu a mudança de
título e, aos poucos, passou a criar suas próprias histórias, que surgiam de
casos que ouvia nas ruas, da observação dos subúrbios cariocas e de casos
fantásticos que escutava quando criança.
Dando vida a algumas
dessas histórias, as jeronimenses Karen Rodrigues e Keyla Echevenguá participam
da peça “A Vida como Nelson É’, montada nas oficinas de teatro da Cia de Arte
de Porto Alegre, com direção de Bob Bahlis.
As primeiras
apresentações aconteceram nos dias 10 e 12 de julho, no teatro da Cia de Arte.
Estão marcadas novas sessões para os dias 31 de julho e 7 de agosto, desta vez
na Casa de Cultura Mário Quintana, que fica na Rua dos Andradas, 736, centro de
Porto Alegre.
Talentos
da Gincana
Porém, “A Vida como
Nelson É” não é o trabalho de estreia delas nos palcos. Para Karen e Keyla, a
Gincana de São Jeronimo foi a porta de entrada para o teatro. Há quase dez anos
as duas começaram a participar do evento, cada uma representando sua equipe e,
consequentemente descobrindo a paixão pela arte.
- Desde que me lembro,
sempre tive interesse pelo meio artístico, seja atuando ou dançando. Meu
primeiro curso de teatro foi no TEPA (Teatro Escola de Porto Alegre), onde me
apresentei com a peça "Procura-se um defunto", que era baseada na
história O Bem Amado, escrita por Dias Gomes. Também tive oportunidade de me
aproximar dessa área através do Show de Escolha a Rainha da Gincana de São
Jerônimo, onde me apresento desde 2005. Creio que desde a infância me
interessava pela atuação, e via isso quando ficava na frente da televisão ou do
espelho imitando falas – revela Karen.
A gincana também
possibilitou o encontro com o diretor Bob Bahlis. Foi por intermédio do evento
que Karen e Keyla conheceram o trabalho de Bob e as oficinas da Cia de Arte.
- Ano passado, o diretor
Bob Bahlis foi contratado como jurado das apresentações, e a Karen me falou das
oficinas. Eu nunca havia feito nada referente a teatro, meu foco era a dança.
Já tinha pensado em fazer algum curso de teatro para me aperfeiçoar mais na
área de interpretação, então quando fiquei sabendo das oficinas, me inscrevi e
fui participar. Fazer teatro foi algo com que aprendi muito e vou levar pra
sempre comigo, pois tudo foi um aprendizado. Nunca tinha feito nenhum trabalho
na área e foi algo que me surpreendeu muito.Eu pensava uma coisa e é algo bem
diferente, é demais. Foi uma experiência muito produtiva pra mim. Vou continuar
fazendo aulas e me aperfeiçoando cada vez mais, e recomendo a todos que tenham
vontade de fazer teatro que vão atrás e façam, pois tenho certeza que jamais irão
se arrepender – comenta Keyla.
As
Histórias de Nelson
Uma mulher curiosa, um
homem que tem seis dedos na mão esquerda, um casal de três... A infidelidade e
as situações curiosas do cotidiano dos personagens de Nelson dão o tom de “A
Vida como Nelson É”. A montagem é uma celebração ao trabalho de um dos mais
importantes jornalistas, escritores e dramaturgos do país. Com a coluna, Nelson
ganhou fama, principalmente com o público masculino, interessado nas histórias
que o ele narrava. No elenco, Rodrigo Obregon, Edgar Rosa, Anelise Karnas,
Juliana Minho Vargas, Róger Fric, Manoela Dittgen, Gissele Fajreldines, Roberto
Von Baranow, Lauren Anyfah de Castro, Sónia Magina Pereira, Luiz Chanan,
Mafalda Panattieri, Rogério Pasquali, Fernando Hammel, Luki Seixas, Paulo del
Toro, Karen Rodrigues, Keyla Echevenguá e Mitchel Gonzalez.
- As histórias possuem
como tema principal a infidelidade. As minhas personagens na peça não fogem a
essa regra: a primeira, Jandira, é uma mulher casada que decide fazer uma
experiência extraconjugal, por curiosidade. A segunda, Ieda, também casada,
realiza experiências extraconjugais, porém dessa vez com o consentimento do
marido. Aliás, essa é uma das características das histórias do Nelson: enredos
meio "perturbadores". Mas, ao mesmo tempo que impressionam, eles nos
fazem identificar com os personagens. A importância da peça é justamente essa,
levar ao público essa identificação com problemas e situações que ocorrem até
hoje e que foram elaboradas por alguém que foi um dos mais importantes
dramaturgos do nosso país – destaca Karen.
Os personagens de Keyla
são diferentes, mas não menos curiosos. Uma jovem que queria casar-se com o
homem que amava e uma criança de família pobre são os papeis que ela encarnou
durante a preparação do espetáculo.
- Em “Quem morre
descansa” fui a Julinha, que trabalhava num escritório com dois rapazes. Ela
era uma moça apaixonada por Norberto e queria muito casar-se com ele, mas a
história tinha um porém: ele já era
casado. Sua esposa estava muito doente, praticamente morta, e Julinha esperava todos
os dias a morte da mesma, pois Norberto, dramatizando a agonia da mulher
durante os meses que se passaram, prometeu que se casaria com ela assim que a
esposa falecesse. Em “O menorzinho”, eu fazia parte de uma família pobre, que
tinha muitos filhos, mas que nenhum sobrevivia, pois sempre morriam de fome. O
pai, que vivia bêbado, não dava a mínima para a família. A mãe das crianças
tinha o sonho de que ao menos um de seus filhos frequentasse a escola, então
nasceu o menorzinho. Porém, ela não sabia que seu sonho causaria um desfecho
traumático para a história – diz Keyla.
O diretor da peça, Bob
Bahlis, conta como funciona a seleção do tema das peças que são montadas nas
oficinas da Cia de Arte, uma vez por semestre. Bob, que já participou de
diversas peças, como o “O Clube dos Cinco”, “Stand Up Drama”, “Pedro Malazarte
e a Arara Gigante”, do Jorge Furtado e "Filhote de Cruz Credo", do
Fabrício Carpinejar, explica como fazer parte das montagens semestrais,
aconselha quem deseja aventurar-se no teatro e fala sobre a experiência de ter
sido jurado do Show de Escolha da Rainha da Gincana.
- Quem quiser participar deve mandar email
para bob.pop@uol.com.br.
Os valores são mensais, R$ 190,00, e as aulas acontecem às segundas e quartas,
das 19h30min às 21h45min, no Centro de Porto Alegre, na Cia de Teatro, de 12 de agosto
a 12 de dezembro. Faremos outra peça para dezembro. Quem deseja ser ator não
deve ficar só na vontade. O processo é lento para uma pessoa acostumar-se ao
palco. Também é importante fazer aulas com um bom diretor.O show é sensacional.
Foi uma grande surpresa quando entrei naquele ginásio lotado e vi o
envolvimento da cidade com a Gincana. Quando cheguei em casa, pesquisei muito
sobre a histórias das gincanas no nosso Estado. Os números dos grupos são
ótimos. Adorei tudo. Fiquei muito impressionado com o que vi. A Karen e a Keyla
já chegaram nas aulas com a bagagem das gincanas, facilitando no processo de
aprendizagem – destaca Bob.
Arte
na Região Carbonífera
A falta de opções na
região para quem deseja seguir carreira no ramo artístico é um fator que dificulta
a revelação de novos talentos.
- O cenário cultural da
região poderia e deveria ser mais valorizado. Acontece muito de ao termos contato
com pessoas de outras cidades, escutarmos que os talentos aqui da região são
muito especiais. O pessoal que se envolve com o baile da gincana, na sua grande
maioria, não teve nenhuma base profissional, mas dançam e atuam incrivelmente
bem. Charqueadas é uma cidade que conta com uma estrutura própria para teatro,
mas também acaba não sendo valorizada como deveria. Acho que isso se dá pela
falta de investimento nessa área e um pouco pelo próprio público, que não tem
conhecimento do tipo de trabalho que pode ser realizado por aqui. Um projeto em
cada município, que oficializasse a longo prazo oficinas e locais estruturados
para isso, seria um bom começo. Tem muita gente querendo aprender a dançar ou
atuar e não sabe onde pode fazer isso – revela Karen.
A
Cia de Arte
O Centro Cultural Cia
de Arte é um projeto com uma proposta inédita no Brasil: um espaço público totalmente
gerido por artistas. Um prédio de nove andares que pertence à Prefeitura de Porto
Alegre, aberto a artistas de todas as áreas: teatro, dança, literatura, música,
artes visuais, circo e capoeira. Fica na Rua dos Andradas, 1780, centro de
Porto Alegre.
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